


21/05/2018; 14/08/2019; 03/07/2020; Recorrente
Ás vezes estou em Lisboa, e parece que a cidade inteira foi transformada em uma espécie de paraíso do novo urbanismo: desde as estradas aos céus, quase todas as vias estão cobertas em linhas de metropolitanos, marcadas por todo o tipo de material rolante a atravessar as ruas Lisboetas. Há elétricos antigos a irem desde o centro a Caneças, metros elevados a passarem por cima da estação de comboio de Benfica, monocarris a ligarem o Parque das Nações à Margem Sul. Sinto que todas estas linhas já estiveram por Lisboa durante décadas e que as frequentei durante toda a minha vida, apesar de elas não existirem realmente.

19/03/2021
Estou na minha escola antiga, aparentemente deparando-me a estudar no ensino básico de novo. Todos os meus colegas antigos ainda estão lá e permanecem com a mesma idade que tinham na altura. Estou no recreio entre aulas, quando subitamente; vejo um disco voador gigante no horizonte a aproximar-se da escola. O pânico instala-se e corremos todos para o interior.
No meio da confusão, acabo por encontrar uma entrada secreta para a cave da escola – e sentado em um sofá, encontro o Julian Assange, o fundador da WikiLeaks. Ele está com outro aluno a falar sobre criptomoedas e segurança digital, até me ver entrar no covil dele.
‘Então, sempre duvidaste de mim, certo?’ – ele diz-me, com um sorriso presunçoso – ‘Senta-te, rapaz. Eu já tinha previsto que tudo isto ia acontecer’.



08/09/2018; 11/03/2020; 24/10/2021; Recorrente
Estou na casa antiga da minha avó paterna. Ela morreu há mais de uma década, mas ás vezes, ela ainda está lá, e ás vezes, não está. Não consigo processar a memória da morte dela, mas consigo processar que algo está errado. Sinto que não devia estar aqui.

09/10/2014
Estava a anoitecer e encontrava-me na estrada, algures pelo interior do país – e não me lembrava de ter tirado a carta ou de ter comprado o Alfa Romeo 1600 laranja que estava a conduzir, só sei que, de alguma maneira, tudo isso tinha acontecido nos últimos dias e culminado neste momento. Uma surpresa ainda mais agradável era o facto de que estava a levar uma colega minha da universidade (éramos também amigos na nossa escola e tínhamos ido juntos para a mesma faculdade naquele ano) de volta à casa dela: Evidentemente, tinha um fraquinho bastante grande pela rapariga, e portanto; a oportunidade de ser-lhe útil como chauffeur e de convivermos algum tempo juntos durante a viagem era imprescindível.
Chegamos à casa dos pais dela – uma pequena moradia tradicional em uma freguesia rural – e inicialmente só esperava deixá-la pela zona e conduzir de volta para Lisboa, mas ela insistiu que eu ficasse e conhecesse a família dela. Entramos juntos, os pais e o irmão dela são extremamente simpáticos comigo, a mãe sugere que eu fique para o jantar, e enquanto isso, a minha colega chama-me para o quarto dela. Entro, e subitamente, ela puxa-me para a cama e senta-se sobre mim.
‘Hey… Queres ficar comigo?’
Surpreendido e um tanto nervoso, apenas consigo sussurrar um pequeno ‘sim’. a minha voz claramente transparecendo a timidez de um miúdo de 17 anos que nunca esteve em uma situação tão comprometedora com uma rapariga.
‘Para sempre?’
Sou tomado pelo tom subtilmente sinistro da pergunta. Inesperadamente, a pele dela começa a apodrecer, os braços transformam-se em tentáculos, o corpo ganha uma forma esquelética e alienígena, dando-me apenas o tempo de escapar das garras dela e correr para fora do quarto. Apresso-me para a sala, a berrar para os pais da minha colega que a filha deles transformou-se em algum tipo de criatura horrível, e eles olham para mim, inexpressivos – e, de forma quase morbidamente cómica, as cabeças deles descolam-se dos corpos e rolam para o chão, como se fossem manequins.
Corro para fora da casa, não encontrando o carro no exterior. Caminho pelas ruas de noite à procura de abrigo, incerto se estou a ser seguido pela criatura ou não, até me deparar com a nossa faculdade. Entro por uma janela e caminho pelos corredores na esperança de encontrar um guarda noturno que me pudesse ajudar, mas infelizmente, encontro-a de novo, agora em um estágio de mutuação ainda mais avançado e horrível do que o anterior. De alguma forma, ela seguiu-me até aqui.
Fujo pela faculdade enquanto ela corre atrás de mim, acabando encurralado em uma das casas de banho. Entro e tranco a porta, e à medida que ela começa a raspar agressivamente para entrar, noto na pequena janela sobre a sanita. Consigo abri-la com algum esforço, mas assim que o faço, oiço um ‘crack’ de madeira atrás de mim.
Da exposição Compilação Digital de Sonhos e Pesadelos

Henrique Matos
Henrique Matos é um realizador e fotógrafo de Lisboa, Portugal. Nascido em 1996, licenciou-se em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e está atualmente a fazer um Mestrado na mesma área, com foco de estudo no cinema e na intersecção entre as artes e as ciências. Em 2017, começou a produzir conteúdos para o grupo de media fotográfica da faculdade (Núcleo de Fotografia AE-FLUL) e desde então tem feito várias exposições por Lisboa e produzido/colaborado em diversos projetos de vídeo.