Feito de pedra

E aos poucos saltavam
Saltavam estilhaços
Às vezes minúsculos
Outrora assustavam.

Belo, como nada
Nada que se compara!
Belo na sua diferença

A cada vento uma diferença
Voavam os segredos
Outrora esculpidas em cada pedregulho.
Voavam histórias
Que ganhavam novas formas
Contadas aos ouvidos menos atentos

Já não se sabe 
Se uma montanha terá sido.
Pois as histórias ganharam formas
Mas perderam detalhes.
Perderam a verdade.

Feito de pedra
Duro como nada
Mas mole como água.

Fet de pedra

E de pok em pok tava saltá
Tava saltá kej estilhasse
Às vex minúskle
Otrora assustador.

Bnit, moda nada
Nada é ke te kompará!
Bnit ne sê difrensa

A kada vente um difrensa
Tava voa kej segrede
Otrora eskulpide ke kada pedra.
Tava voá kej história
Ek tava ganhá nôve forma
Kontode ne kej uvid menos atente

Já não se sabe 
Se um montanha el foi.
Mode kej história ganha forma 
Má perdê detalhe.
Ej perdê verdade.

Fet de pedra
Duro kôme nada
Má mole moda água.

Memória

Hoje não devia ter-me lançado ao mar
Sob estas ondas que se faziam mansas
Que acariciava a areia
Num tom de íntimos abraços
Transbordando risos
Fixando olhares.

A praia era uma poesia
Com estrofes enterradas nas areias
Lidas pelos ventos às aves
Num dia de sol escaldante que não fazia medo

Maldita tempestade!

Fecho os olhos 
E me vejo a deriva
Enfrentando as águas enfurecidas e,
Estes ventos desgraçados
Eu, num bote
Com as minhas armas:
Um motor morto e um par de remos, 
A minha fé e as minhas orações.

Minha sina esta,
De pobre homem 
Que come destas ondas
E vive querendo elas
Ignorando as traições 

Minha sina, 
Este mar
O carcereiro das minhas ilhas.

Memória

Hoje ej ká divia ter mi ptod na mar
D´sima dex onda ek tava mansa 
E ke tava karisiá areia
Num tom de íntimoj abrasse
T transbordá rise
T fixá olhares.

Kel praia era um poesia
Ke estrofes interrode na areia
Lide pe vente à kej aves
Num dia de sôl eskaldante ke´n dava fazê medo

Maldite tempestade!

Um te ftxa oí
E um te oiá mim mesmo a deriva
Te infrentá kej água enfureside e,
Kej vente desgrassôde
Mim, num bôte
Ke nhes arma:
Um motor morte e um par de réme,
Nhe fé e nhas orasão.

Nhá sina esse,
Dum pobre home
Ek te kmê dex onda
E vivê te krêj
Te ignorá kej traissão

Nhá sina,
Esse mar
Karserer dex nhas ilha.

Mulher d’ilha

Nesta corrida que nem o sol te alcança
Pois o teu despertar é ainda quando
Só te pode testemunhar a lua.

Derrubando muralhas aos murros,
Gritando aos ventos os seus sonhos,
Desbravando caminhos nunca antes imaginado
E marchando de pés firmes 
A tua luta avança.

Orgulha o mundo o teu ventre
Que deu luz às gentes dessas ilhas
Estes que orgulham o mundo nos quatro cantos.

A tua cintura carrega o nó seco
Da tua história de labuta.
Estes olhos testemunhas das tuas dores
Contadas em lágrimas quentes
Que teimavam em banhar a sua face
Mas nunca apagaram o seu riso!

És tu pois mulher d’ilha
Descrita em poesias perfeitas
E entoadas em vozes sinceras
Vezes sem conta.
És tu pois mulher
Que de quando em vez
Esquece a saia e traja à calça.
E só poderias ser tu
A origem do riso do seu filho.

27-03-2021

Melher d’ilha

Ness krrida ke nem sol te alkansob
Mod bô despertar é inda kond 
Só kem te podê testemunhob ê lua  

Te derrubá muralhas e murros 
Te grita à vente bôs sonhe 
Te desbravá kamin nunka antes imaginod 
E te marxá de pê firme 
Bô luta te avanssá 

Te orgulha mundo bô ventre 
Ek dá luz à ex gente dess ilha 
Ex ek te orgulha mund ne sij kuatre kont 

Bô sintura te karregá um nô sek
De bô história de labuta 
Ex oí testemunjas de bôj dor 
Kontod em lágrima kent 
Ek te teimá em banhá bô roste 
Má nunka ej pagá bo surrise!

Bô é pois melher d´ilha 
Diskreta em poesia perfeite  
E entuóde nuns voz sinser 
Vex sim konta. 
Bô é pois melher 
Ke de kond in vez 
Te eskse saia e te psti kalsa. 
E sô podia ser bô 
Kel origem de surrise de bô fidje. 

27-03-2021

Manuel Santos

Manuel João dos Santos é licenciado em Ciências Sociais e Políticas pela Universidade de Cabo Verde. Jovem escritor cabo-verdiano, natural de Tarrafal de Santiago, onde começou a sua escrita, inspirada na vivência da sua comunidade. Membro da ALTAS – Associação Literária do Tarrafal de Santiago, desde a sua criação, o que lhe tem proporcionado a oportunidade de participar em diversas revistas. Integra a primeira antologia de poetas de Tarrafal de Santiago.

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